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A Resolução CNJ n.º 586/2024 e a Desconstrução dos Princípios Protetivos do Direito do Trabalho: Análise Crítica

Atualizado há 3 meses ago.

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Por Claudio Mendonça

1. Introdução

A Resolução n.º 586/2024 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que regulamenta os acordos extrajudiciais na Justiça do Trabalho, tem como objetivo declarado reduzir a litigiosidade e promover a segurança jurídica. No entanto, sua implementação levanta sérias preocupações quanto à desproteção dos trabalhadores e ao enfraquecimento dos princípios fundamentais do Direito do Trabalho. Ao permitir a quitação ampla, geral e irrevogável, a Resolução ignora a hipossuficiência do trabalhador e subverte a essência protetiva da Justiça Trabalhista, colocando em risco o próprio equilíbrio das relações laborais.

2. Violação dos Princípios Protetivos do Direito do Trabalho

2.1 Princípio da Proteção

O princípio da proteção, núcleo central do Direito do Trabalho, visa garantir a superioridade normativa da condição mais benéfica ao trabalhador, reconhecido como a parte mais vulnerável na relação empregatícia. A Resolução 586/2024, ao impor a quitação irretratável de todos os direitos trabalhistas no momento da homologação de acordo extrajudicial (art. 1º, §1º), fere esse princípio diretamente. A quitação ampla retira do trabalhador a possibilidade de pleitear direitos que não tenham sido devidamente considerados, rompendo a função corretiva da Justiça do Trabalho, essencial para mitigar a desigualdade inerente à relação laboral.

Esse movimento assemelha-se à flexibilização promovida pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), que, sob o pretexto de modernizar as relações de trabalho, diluiu garantias legais e ampliou a vulnerabilidade do trabalhador, desconsiderando a natureza protetiva do Direito do Trabalho.

2.2 Princípio da Irrenunciabilidade

O princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, consagrado na Constituição Federal e na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), impede que o trabalhador abdique de garantias mínimas. A Resolução 586/2024 permite que, em troca de acordos rápidos, o trabalhador renuncie a reivindicações futuras que possam emergir, como diferenças salariais ou danos materiais e morais decorrentes de relação de trabalho ainda não completamente apurada. Tal disposição, ao tornar irrevogável a quitação dos direitos, afronta diretamente a jurisprudência consolidada do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que historicamente reconhece a indisponibilidade dos direitos laborais em função da vulnerabilidade econômica e jurídica do trabalhador.

2.3 Princípio da Primazia da Realidade

Outro princípio fundamental desrespeitado pela Resolução é o da primazia da realidade. Este princípio estabelece que, em caso de divergência entre o que é formalmente registrado e a realidade da prestação laboral, deve prevalecer o que de fato ocorreu na relação de trabalho. Ao tornar imutável a homologação de acordos, a Resolução 586/2024 inviabiliza a revisão judicial de circunstâncias não conhecidas ou omitidas no momento da quitação, como o surgimento de doenças ocupacionais, erros nos cálculos de verbas rescisórias, ou mesmo fraudes cometidas pelo empregador. Esse cenário abre espaço para que o empregador imponha condições desfavoráveis ao trabalhador, confiando na impossibilidade de reabertura judicial do acordo.

3. Impactos na Justiça do Trabalho

3.1 Fragilização da Justiça Especializada

A Justiça do Trabalho, historicamente reconhecida como o braço do Judiciário que garante o equilíbrio entre capital e trabalho, enfrenta esvaziamento de sua função protetiva com a implementação da Resolução 586/2024. A função mediadora e fiscalizadora do juiz trabalhista, ao homologar acordos que promovam a pacificação de conflitos, é significativamente diminuído quando se impõe a quitação ampla e irrevogável. Tal situação reduz a capacidade do magistrado de proteger o trabalhador em situações de abuso ou coação, transformando a Justiça do Trabalho em mera homologadora de acordos, sem poder de intervenção ou revisão.

3.2 Diminuição do Controle Judicial e Acesso à Justiça

O artigo 5.º, inciso XXXV, da Constituição Federal assegura o direito de todo cidadão de buscar a tutela jurisdicional em caso de lesão ou ameaça a direito. No entanto, a Resolução 586/2024 impõe barreira ao acesso à Justiça Trabalhista, ao impedir que o trabalhador recorra ao Judiciário para revisar o acordo extrajudicial homologado. A insegurança quanto à correta aplicação e interpretação dos direitos trabalhistas nas negociações pode agravar a precariedade das condições de trabalho e aumentar o número de situações de exploração que passam sem a devida tutela judicial.

4. Análise Crítica de Vólia Bonfim

Reconheço a grandeza de Vólia Bonfim ao expor com clareza as contradições internas da Resolução CNJ nº 586/2024. Vólia, com sua vasta experiência e conhecimento em Direito do Trabalho, apresenta  análise crítica e bem fundamentada sobre as consequências dessa nova regulamentação.

Ela destaca que, embora a resolução tenha como objetivo a redução das ações trabalhistas, ao impor quitação ampla dos acordos homologados, acaba por criar uma série de exceções que comprometem sua eficácia. A jurista explica que as exceções relacionadas a doenças ocupacionais não especificadas e lesões desconhecidas no momento do acordo enfraquecem a abrangência da quitação que, teoricamente, deveria ser “ampla e irrestrita”. Essa flexibilização pode gerar aumento de litígios, que trabalhadores, posteriormente, poderão alegar desconhecimento de tais questões, reabrindo espaço para disputas judiciais.

A articulista também ressalta que a proibição da homologação parcial de acordos vai contra o que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê, levantando a questão sobre a competência do CNJ em criar regras que não estão previstas em lei. Sua análise expõe, com precisão, como a resolução introduz novas normativas sem a devida fundamentação legal, abrindo margem para contestações sobre a validade e aplicação dessas inovações.

Assim, ao expor as contradições internas da Resolução, ilumina o paradoxo de uma medida criada para reduzir litígios pode, na realidade, gerar insegurança jurídica e aumentar o número de ações trabalhistas. O autor deste texto, portanto, reverencia a escritora por sua capacidade de dissecar as nuances dessa problemática, demonstrando sua habilidade em articular críticas robustas e bem fundamentada, essencial para o debate jurídico atual.

5. Consequências Práticas da Resolução 586/2024

5.1 Renúncia de Direitos em Situações de Pressão Econômica

A imposição de quitação irrevogável coloca o trabalhador em situação de extrema desvantagem, especialmente em um cenário de crise econômica ou necessidade urgente de recursos financeiros. A aceitação de acordos desfavoráveis, motivada pela precariedade da condição econômica, representa  forma velada de renúncia a direitos fundamentais. A Justiça do Trabalho, ao homologar tais acordos sem a possibilidade de revisão, acaba por legitimar essa pressão econômica, perpetuando um sistema de desigualdade estrutural.

5.2 Ampliação da Vulnerabilidade Trabalhista

Ao retirar a possibilidade de contestação futura, a Resolução fortalece a figura do empregador na negociação, reduzindo drasticamente a capacidade do trabalhador de se defender em casos de erros, omissões ou mesmo fraudes que possam surgir após a homologação. Tal medida favorece apenas do empregador, enquanto o trabalhador é privado de garantias básicas, violando o equilíbrio que deveria ser assegurado pela Justiça do Trabalho.

6. Considerações Finais

A Resolução CNJ n.º 586/2024, longe de promover a eficiência na solução de conflitos trabalhistas, representa uma grave ameaça à função protetiva do Direito do Trabalho e a sua existência como órgão de proteção dos direitos dos trabalhadores. A quitação ampla, geral e irrevogável imposta pela Resolução fragiliza os princípios fundamentais que orientam a legislação trabalhista brasileira, além de violar o direito constitucional de acesso à Justiça.

É urgente que essa Resolução seja revista, sob pena de comprometer seriamente a proteção jurídica do trabalhador no Brasil, abrindo precedentes para a desvalorização do trabalho e a consolidação de um modelo de Justiça Trabalhista meramente homologadora de acordos que ignoram a realidade da relação laboral e as condições de desigualdade entre as partes.

Referências:

  • Bomfim, Vólia. Nova resolução do CNJ para redução do volume de reclamações trabalhistas: Eficaz? Migalhas, 16 de outubro de 2024. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/417516/nova-resolucao-do-cnj-para-reducao-do-volume-de-reclamacao-trabalhista>
  • Brasil. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal.
  • Brasil. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Decreto-Lei n.º 5.452, de 1º de maio de 1943.
  • CNJ. Resolução n.º 586/2024. Disponível em: www.cnj.jus.br.
  • Tribunal Superior do Trabalho. Jurisprudência Trabalhista Consolidada. Disponível em: www.tst.jus.br.

Falar com Claudio Mendonça.

Autor: Claudio Mendonça é advogado, pós-graduado em direito previdenciário, com vasta experiência em processo trabalhista, bem como, em ajudar as pessoas a conhecer seus direitos trabalhista e previdenciário.

Saiba mais:
https://claudioadv.com.br

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