1. Introdução
A violência e a discriminação contra a mulher no ambiente de trabalho são questões que refletem desigualdades estruturais e práticas abusivas presentes na sociedade. Embora a violência contra a mulher seja frequentemente associada ao contexto doméstico, o ambiente profissional também é palco de agressões e discriminações que resultam em danos emocionais, psíquicos e materiais significativos. Essas agressões incluem assédio moral, assédio sexual e discriminação de gênero, incluindo a discriminação salarial, que impactam profundamente a dignidade, a saúde mental e o bem-estar financeiro das mulheres.
Este artigo analisa os aspectos jurídicos que envolvem essas práticas de violência e discriminação no ambiente de trabalho, examinando a legislação pertinente e destacando decisões dos tribunais que têm abordado essas questões com sensibilidade e rigor.
2. Formas de Violência e Discriminação no Ambiente de Trabalho
As mulheres enfrentam diversas formas de violência e discriminação no ambiente de trabalho, cada uma com impactos distintos:
– Assédio Sexual: Inclui avanços sexuais indesejados, propostas indecentes e comportamentos de natureza sexual que criam um ambiente de trabalho intimidante e ofensivo.
– Assédio Moral: Envolve comportamentos abusivos, como humilhações repetitivas, insultos e atitudes que visam desestabilizar emocionalmente a vítima.
– Discriminação de Gênero: Manifesta-se na desigualdade de oportunidades, como a promoção de homens em detrimento de mulheres, mesmo quando as mulheres têm qualificações iguais ou superiores.
– Discriminação Salarial: Refere-se à prática de pagar salários diferentes a homens e mulheres que desempenham a mesma função, com as mesmas qualificações e responsabilidades, violando o princípio da igualdade salarial.
Essas práticas não só violam direitos fundamentais, como a dignidade e a integridade moral, mas também afetam negativamente a saúde mental das trabalhadoras, podendo causar ansiedade, depressão, estresse pós-traumático e problemas financeiros decorrentes da discriminação salarial.
3. Fundamentação Legal
A legislação brasileira oferece diversas proteções contra a violência e a discriminação no ambiente de trabalho, com dispositivos específicos para combater a desigualdade salarial:
– Constituição Federal de 1988: O artigo 5º, inciso I, garante a igualdade de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. O artigo 7º, inciso XXX, proíbe a diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.
– Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):
– Artigo 373-A: Proíbe práticas discriminatórias para efeito de acesso a relação de emprego ou sua manutenção, incluindo discriminação em função do sexo.
– Artigo 461: Trata da isonomia salarial, estabelecendo que todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá o mesmo salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.
– Artigo 482: Inclui assédio sexual e moral como justa causa para a rescisão do contrato de trabalho por parte do empregador.
– Lei nº 9.029/1995: Proíbe a adoção de práticas discriminatórias e limitativas para efeito de acesso a relação de emprego ou sua manutenção por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil ou idade.
– Lei de Igualdade Salarial (Lei nº 12.984/2014): Estabelece que homens e mulheres devem receber salários iguais para funções idênticas e de igual valor, reforçando a isonomia salarial prevista na CLT e na Constituição Federal.
– Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006): Embora focada na violência doméstica, seus princípios são utilizados para proteger mulheres em casos de violência em outros contextos, incluindo o ambiente de trabalho.
Julgamento com perspectiva de gênero: A Resolução nº 492/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabeleceu o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, esta abordagem já havia sido prevista na Recomendação nº 128/2022, também do CNJ. A questão mais ampla que a análise da isonomia ou equiparação salarial, Para O Desembargador Marcos Fagundes Salomão, não se justifica que a empregada mulher, ocupando o mesmo cargo que empregados homens, receba salário inferior aos colegas. “É imprescindível a adoção dos julgamentos pela perspectiva de gênero para corrigir as desigualdades vivenciadas pelas mulheres em diversos níveis e nichos da sociedade e do trabalho”, salientou.
4. Jurisprudência Relevante
Os tribunais brasileiros têm se mostrado comprometidos com a proteção das mulheres contra a violência e discriminação no ambiente de trabalho, refletido em decisões judiciais significativas:
– Assédio Sexual e Indenização por Danos Morais: O Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem reconhecido consistentemente que o assédio sexual viola a dignidade das trabalhadoras. Em um caso (TST-AIRR-10139-94.2021.5.03.0186), a empresa AMERICANAS S.A. foi condenada a pagar indenização no valor de R$ 50.000,00, por danos morais a uma funcionária que sofreu assédio sexual por parte de um superior, destacando a responsabilidade objetiva do empregador em garantir um ambiente de trabalho seguro.
– Assédio Moral e Responsabilidade do Empregador: Em decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2), uma empresa foi condenada a indenizar uma funcionária por assédio moral contínuo praticado por superiores. Diante da comprovação cabal, pelo depoimento testemunhal, de submissão da parte autora a constrangimento e humilhação por meio de gritos e xingamentos, corroboro a conclusão do juiz sentenciante de que a parte autora teve seus direitos da personalidade (art. 5º, X, da CF/1988) violados, o que autoriza a reparação dos danos morais causados”, considerou a magistrada (TRT-2, Processo nº 0001485-42.2019.5.12.0056).
– Discriminação Salarial: Em uma decisão marcante, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4) condenou uma empresa a pagar indenização a uma trabalhadora que recebia salário inferior ao de um colega homem que exercia a mesma função, com igual qualificação e responsabilidade. O tribunal fundamentou a decisão com base no artigo 461 da CLT e nos princípios constitucionais de igualdade (TRT-4, Processo nº 0021456-29.2019.5.04.0020).
– Políticas Preventivas e Medidas Punitivas: O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT-12) destacou a importância de políticas internas para prevenir o assédio e a discriminação. Em um caso, a falta de tais políticas levou à condenação de uma empresa por omissão, obrigando-a a implementar programas de conscientização e criar canais seguros para denúncia (TRT-12, Processo nº 0000209-67.2021.5.12.0016).
– Equiparação com Violência Doméstica: O TRT-12 também reconheceu a semelhança entre os danos emocionais sofridos no ambiente de trabalho e os sofridos em casos de violência doméstica, aplicando medidas protetivas análogas às previstas na Lei Maria da Penha para proteger uma trabalhadora vítima de assédio sexual.
5. Conclusão
A violência e a discriminação contra a mulher no ambiente de trabalho representam violações graves dos direitos humanos e trabalhistas, exigindo ações efetivas tanto no âmbito legislativo quanto judicial para a sua erradicação. A legislação brasileira e a jurisprudência têm desempenhado um papel crucial na proteção dos direitos das mulheres, assegurando um ambiente de trabalho seguro, digno e justo.
Para que essas garantias sejam plenamente efetivas, é necessário um compromisso contínuo das empresas em adotar políticas de prevenção, promover a igualdade salarial, criar canais de denúncia eficazes e responsabilizar os infratores. Além disso, a conscientização da sociedade e a educação sobre os direitos das mulheres são fundamentais para construir uma cultura de respeito e igualdade no ambiente de trabalho.
Referências
– Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: [http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm](http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm).
– Brasil. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Disponível em: [http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm](http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm).
– Brasil. Lei nº 9.029, de 13 de abril de 1995. Disponível em: [http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9029.htm](http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9029.htm).
– Brasil. Lei nº 12.984, de 2 de junho de 2014. Disponível em: [http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12984.htm](http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12984.htm).
– Brasil. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha). Disponível em: [http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm](http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm).
Autor: Claudio Mendonça é advogado, pós-graduado em direito previdenciário, com vasta experiência em processo trabalhista, bem como, em ajudar as pessoas a conhecer seus direitos trabalhista e previdenciário.
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